quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Desilusão



Hoje, rasguei-te as vestes tecidas pela minha fantasia e vi-te tal qual como és, no pedestal de orgulho em que te colocas, na arrogância que ostentas, na vitimização com que te escudas.
Hoje, estive frente a frente com a velhice mental das ideias e preconceitos que te habitam, disfarces perfeitos para a cobardia que pretendes oculta.
Hoje, percebi que foste apenas uma ilusão, alimentada por sonhos deliberadamente prolongados pelo meu inconsciente, com a insensatez de quem se recusa a acreditar no óbvio.
Hoje, sei o quão ocas e estéreis foram as palavras apaixonadas das quais apenas resta o eco de promessas logo moribundas ao nascerem.
Hoje, soube que no conforto da tua insensibilidade nem sequer tentaste ler-me ou penetrar na minha alma que, um dia, sonhou fundir-se com a tua.
Hoje, do fogo restam cinzas e na memória fica apenas o retrato do mais perfeito egoísmo que se pode contemplar.
Hoje, sei que o que nos separa não é a vida. És tu!

domingo, 2 de novembro de 2008

Eternamente



Eu acredito na continuidade das coisas que amamos, acredito que para sempre ouviremos o som da água no rio onde tantas vezes mergulhámos a cara, para sempre passaremos pela sombra da árvore onde tantas vezes parámos, para sempre seremos a brisa que entra e passeia pela casa, para sempre deslizaremos através do silêncio das noites quietas em que tantas vezes olhámos o céu e interrogámos o seu sentido.
Nisto eu acredito: na veemência destas coisas sem princípio nem fim, na verdade dos sentimentos nunca traídos.
E a tua voz ouço-a agora, vinda de longe, como o som do mar imaginado dentro de um búzio. Vejo-te através da espuma quebrada na areia das praias, num mar de Setembro, com cheiro a algas e a iodo. E de novo acredito que nada do que é importante se perde verdadeiramente. Apenas nos iludimos, julgando ser donos das coisas, dos instantes e dos outros. Comigo caminham todos os mortos que amei, todos os amigos que se afastaram, todos os dias felizes que se apagaram. Não perdi nada, apenas a ilusão de que tudo podia ser meu para sempre.

Miguel Sousa Tavares

(No dia 2 de Novembro, dedico as palavras de M.S.T. aos que amei com toda a força do meu coração e que a morte levou. Acredito que vive um pouco Deles no brilho das estrelas que iluminam as minhas noites)